Contatos: imprensa@tce.rs.gov.br Fone: (51) 3214-9870

segunda-feira, 8 de março de 2010

A INFANTICIDA MARIA FARRAR

Bertold Brecht


Maria Farrar, nascida em abril, sem sinais particulares,
menor de idade, orfã, raquítica,
ao que parece matou um menino da maneira que se segue,
sentindo-se sem culpa.
Afirma que grávida de dois meses
no porão da casa de uma dona
tentou abortar com duas injeções dolorosas, diz ela,
mas sem resultado.
E bebeu pimenta em pó com álcool,
mas o efeito foi apenas de purgante.
Mas vós, por favor, não deveis vos indignar.
Toda criatura precisa da ajuda dos outros.
Seu ventre inchara, agora a olhos vistos
e ela própria, criança, ainda crescia.
E lhe veio a tal tonteira no meio do ofício
das matinas e suou também de angústia aos pés do altar.
Mas conservou em segredo o estado em que se achava
até que as dores do parto lhe chegaram.
Então, tinha acontecido também a ela,
assim feiosa, cair em tentação.
Mas vós, por favor, não vos indigneis.
Toda criatura precisa da ajuda dos outros.
Naquele dia, disse, logo pela manhã,
ao lavar as escadas sentiu uma pontada
como se fossem alfinetadas na barriga.
Mas ainda consegue ocultar sua moléstia e o dia inteirinho,
estendendo paninhos, Buscava solução.
Depois lhe vem à mente que tem que dar à luz
e logo sente um aperto no coração.
Chegou em casa tarde.
Mas vós, por favor, não vos indigneis.
Toda criatura precisa da ajuda dos outros.
Chamaram-na enquanto ainda dormia.
Tinha caído neve e havia que varrê-la, às onze terminou.
Um dia bem comprido.
Somente à noite pode parir em paz.
E deu à luz, pelo que disse, a um filho,
mas ela não era como as outras mães.
Mas vós, por favor, não vos indigneis.
Toda criatura precisa da ajuda dos outros.
Com as últimas forças, ela disse, prosseguindo,
dado que no seu quarto o frio era mortal,
se arrastou até a privada, e ali,
quando não mais se lembra, pariu como pôde quase ao amanhecer.
Narra que, a esta altura, estava transtornadíssima,
e meio endurecida e que o garoto,
o segurava a custo pois que nevava dentro da latrina.
Entre o quarto e a privada o menino prorrompeu em pratos
e isso a perturbou de tal maneira, ela disse,
que se pôs a socá-lo às cegas, tanto, sem cessar, até o fim da noite.
E de manhã o escondeu então no lavatório.
Mas vós, por favor, não deveis vos indignar,
toda criatura precisa da ajuda dos outros.
Maria Farrar, nascida em abril,
morta no cárcere de Moissen,
menina-mãe condenada,
quer mostrar a todos o quanto somos frágeis.
Vós que parís em leito confortável
e chamais bendito vosso ventre inchado,
não deveis execrar os fracos e desamparados.
Por obséquio, pois, não vos indigneis.
Toda criatura precisa da ajuda dos outros

Nenhum comentário:

Postar um comentário